Inclusão profissional de jovens com deficiência intelectual
Em Lourel há resposta social adaptada a pessoas com deficiência intelectual – o CACI da CERCITOP – Cooperativa de Empreendedorismo para o Desenvolvimento Económico e Social de Todo o País, CRL.
Muitos jovens têm uma rotina profissional diária em empresas e há outros tantos que ambicionam tê-la. Quando a carência de recursos humanos é uma realidade que afeta tanto o mercado de trabalho, é imperativo dar a conhecer os benefícios reais para os empregadores deste projeto magnífico de inclusão profissional.
Catarina Cera e Rita Bettencourt, coordenadora do Centro de Atividades e Capacitação para a Inclusão (CACI) de Lourel e de Sintra e psicóloga responsável pelas atividades socialmente úteis, respetivamente, receberam-nos com espírito de total partilha e cooperação.
Conhecemos jovens que desenvolvem atividade profissional em duas empresas sediadas em Sintra e ficámos verdadeiramente surpreendidos com as magníficas instalações do CACI, mesmo ao lado do Sporting Clube de Lourel.
É lá que, diariamente, tem lugar uma verdadeira linha de montagem, participada por jovens utentes que trabalham no embalamento de molas de roupa e na montagem de bucins.
Numa semana produzem-se mais de 30 mil peças (bucins) e embalam-se mais de 50 caixas de molas de roupa.
A Margem, empresa de Mem Martins com 40 anos de história na produção de produtos de higiene e limpeza, associada da AESINTRA, é a empregadora destes jovens que durante parte do seu dia dedicam algumas horas nestas tarefas e são remunerados por isso. Sem nunca saírem das instalações da CERCITOP porque o seu grau de autonomia não permite, sentem-se profissionalmente úteis e incluídos numa sociedade que tende, genericamente, a descriminar a deficiência.
Paralelamente a esta linha de montagem, existem outras atividades a decorrer na instituição, por exemplo: o projeto de confeção de bolachas – o CERCICOOKIE; o bar, onde vários jovens dão apoio; a lavandaria, aberta a serviço externo a preços acessíveis; o apoio ao motorista da instituição; a própria receção de novos utentes e várias tarefas administrativas executadas por muitos destes jovens.
Para a CERCITOP qual a grande importância desta conversa com a AESINTRA? As empresas e a atividade económica do concelho são o objeto de trabalho da AESINTRA. Quem melhor do que a vossa associação empresarial para dar a conhecer este projeto de inclusão profissional de jovens com deficiência intelectual, aptos para inserção no mercado de trabalho?
Na prática como funcionam as atividades socialmente úteis que os jovens podem desempenhar no exterior? A parceria com as empresas é com a CERCITOP, não é diretamente com os jovens. Eles têm Seguro, são transportados por nós para o local, mas muitos deles nem sequer precisam porque são completamente autónomos. Inicialmente a integração na empresa é sempre acompanhada por um monitor da CERCITOP.
As empresas são recetivas à parceria? É difícil abrirmos as portas das empresas, explicar o programa, e acima de tudo mostrar que estes jovens são sempre uma mais-valia, mais dois braços que podem desempenhar tarefas diversificadas. Tarefas que não os diminuem, nem são redutoras – o que eles querem é ser úteis à sociedade! Importa também adiantar que estes jovens são trabalhadores remunerados pelo trabalho que fazem e esse é um princípio pilar que não abandonamos.
Que empresas já são vossas parcerias? Temos doze jovens a trabalhar no Pingo Doce do Alegro Sintra, todas as manhãs, de segunda a sexta, com tarefas de reposição. Esta cadeia de hipermercados fez questão de manter a remuneração de cada um dos nossos jovens, mesmo durante a pandemia e tem ainda o cuidado de pagar as férias. Outro grande parceiro é a Margem, empresa de artigos de limpeza e higiene, assim como a Euro2, empresa de artes gráficas, onde estão dois dos nossos utentes.

Qual é o saldo destas parcerias? Muito positivo, mas precisamos de mais empresas parceiras para encaminharmos os tantos jovens que temos em espera, perfeitamente funcionais para desempenhar tarefas várias, nomeadamente as que são mais mecanizadas. Nem calculam os ambientes engraçados e saudáveis que se criam entre os nossos jovens e os restantes trabalhadores das empresas parceiras. Há muita empatia e proximidade. Todos ganham.
É um trabalho remunerado? Sim, fazemos questão de explicar isso mesmo aos nossos parceiros. Não é voluntariado e está legislado. A legislação dos CACI, o que nos diz, é que deve ser paga mensalmente uma remuneração a cada um destes utentes, no valor mínimo de 10% do IAS. O acordo que fizemos com os nossos parceiros implica o pagamento de 40 euros mensais a cada um dos jovens. A empresa transfere este valor para a CERCITOP que se encarrega de distribuí-lo por cada um dos jovens. Caso as empresas não estejam disponíveis para esta remuneração, estamos flexíveis para avaliar outro tipo de parceria, desde que ela traga valorização ao jovem. A jornada diária de trabalho só pode ser de 20 horas semanais e sempre que se verificam falhas, por exemplo faltas por doença ou outra razão, temos jovens com contrato de substituição.
Quais são as principais dúvidas dos empresários quando lhes é apresentada esta oportunidade de parceria com a CERCITOP? É sempre em torno dos valores remuneratórios que se instalam as principais dúvidas e também há ainda a noção de que estes jovens são voluntários, mas eles realizam um trabalho efetivo. Há muitos mitos criados em redor da deficiência intelectual….
Que mitos são esses e como podem condicionar o empresário/empresa? A deficiência está muito associada à agressividade e à sexualidade e a sociedade tem mesmo de desconstruir estes preconceitos. Estes jovens só não são ainda mais funcionais porque a nossa sociedade não tem uma linguagem acessível, ou seja, o erro não está neles, mas sim nos locais e nos ambientes que não estão adaptados. Já foram dados muitos passos importantes, mas nesta questão ainda há muito trabalho a fazer. A legislação do maior acompanhado é uma mudança muito positiva que acabou por alargar os horizontes do entendimento do défice cognitivo e veio acabar com a distinção exclusiva entre o grupo dos capazes e dos não capazes.
TESTEMUNHOS

ARETHA RIBEIRO
Aretha é uma das candidatas ao trabalho externo em parceria com as empresas. Está há dois anos na CERCITOP e é lá que ajuda no bar e em tarefas administrativas, aliás, para se sentar à conversa connosco, interrompeu a digitalização de processos de utentes que estava a fazer, de forma perfeitamente autónoma.
Esta jovem integra ainda um projeto de investigação no ISCSP, na Ajuda, para onde se desloca autonomamente.
Há dois anos fez uma formação de Cozinha e Bar na Fundação Liga e quando perguntamos onde gostaria de trabalhar, fora das paredes da CERCITOP, a Aretha responde: “atrás de um balcão de restaurante ou de bar, ou então a servir às mesas”.
A informática e a estética são outros dos interesses da Aretha que queria muito trabalhar no exterior para “ganhar um dinheirinho extra e ajudar a mãe”, ou então, para “realizar sonhos”, que passam, na sua maioria, por viajar.
ANDREIA CATARINA E SANDRA LAMEIRAS
A Andreia e a Sandra integram a equipa de 12 jovens que trabalham na reposição do Pingo Doce. Ambas gostavam de trabalhar mais horas para ganhar mais dinheiro.
A Sandra está alocada à reposição de bebidas, tarefa mais exigente por requerer mais cuidado extra no manuseamento das garrafas. Na CERCITOP, a jovem é uma das responsáveis pelo bar e também integra a equipa da CERCICOOKIE, projeto de confeção de bolachas.
ANA BORREGO
Nas palavras das técnicas com quem falámos, a Ana Borrego é “muito funcional, competente e responsável, e é uma das jovens com melhor perfil para estar integrada no exterior”.
A Ana esteve sempre afeta à lavandaria, mas por motivos de saúde não pode estar ao ferro. É outra das jovens responsáveis pelo bar da CERCITOP e na prática sabe fazer de tudo um pouco, de forma perfeitamente autónoma.
Vive em Rio de Mouro e por sugestão da própria CERCITOP foi-lhe proposto que pudesse viver sozinha com supervisão, mas a Ana optou por não o fazer e está no Lar Residencial do Recoveiro.
É esta a realidade da inclusão profissional de pessoas com deficiência intelectual que a empresas precisam conhecer e assumir como uma forte oportunidade para a crise de recursos humanos que o país atravessa. Este programa de inserção tem já provas dadas das potencialidades e vantagens para as várias partes da equação – jovens e empresas parceiras – estando a faltar uma maior abertura por parte das últimas e uma maior dedicação na divulgação e construção de pontes; a AESINTRA tem a responsabilidade e até a vocação de estabelecê-las.
Esta reportagem é disso que se trata – abrir novos horizontes ao tecido económico e empresarial de Sintra.
Poupe tempo e custos ao ser sócio da AESINTRA

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